posso afirmar que sempre convivi com uma incrível dose de inquietação e curiosidade, características que têm influenciado a minha criação artística

Iniciei-me no piano a partir de uma formação musical tradicional, estudando desde criança e sonhando em seguir uma carreira de pianista de concerto. Na infância e pré-adolescência tive ótimas professoras particulares que me ensinaram o básico e, posteriormente, já dividido entre a arquitetura e a música, tive a sorte de me aperfeiçoar com um verdadeiro ícone do piano brasileiro, a pianista Magda Tagliaferro (1893-1986), em sua escola no Brasil e, depois, na Europa, como bolsista do governo francês, em 1980/81.

it is possible to say that I have always lived with an incredible amount of restlessness and curiosity, characteristics that have influenced my artistic creation.

I started my piano studies having a traditional background, studying since childhood and trying to pursuit a career as a concert pianist. During my childhood and pre-adolescence years I had great teachers that taught me the basics, and later, divided between architecture and music, I had the opportunity to improve my technique with a true icon of the Brazilian piano, Mrs. Magda Tagliaferro (1893-1986), in her school in Brazil and, later, in Europe, with a scholarship provided by the French government ( 1980/81).

 
 
 

 

 

Durante o período da bolsa, comecei a ter dúvidas diretamente relacionadas a uma sensação de inadequação: a constatação de que havia uma grande quantidade de pianistas fazendo exatamente a mesma coisa que eu.

Isso era motivo de angústia, pois não via muito sentido em continuar a vida toda me empenhando na prática de um instrumento para simplesmente reproduzir o repertório musical “standard”, como dizia a querida pianista brasileira Yara Bernette (1920-2002). Cheguei a realizar muitos concertos solo e com orquestras no Brasil e no exterior. Entretanto, não somente a enorme concorrência, mas sobretudo ficar na mesmice me apavorava, sentia que isso não era projeto de vida para mim. Observava tantos excelentes pianistas seguindo esse belo roteiro, mas achava aquilo tudo muito previsível e me perguntava se era isso mesmo o que queria, ser mais um em uma imensa constelação de pianistas. 

 
 

During the scholarship period I started to have doubts related to a feeling of not beeing satisfied enough: I realized that there were a lot of pianists doing exactly the same thing as me.

This made me feel restless because I didn't see much sense in keep practicing all my life just to simply reproduce the "standard musical repertoire”, as the dear Brazilian pianist Yara Bernette (1920-2002) used to say. I have played in many concerts, solo and with orchestras, in Brazil and abroad. However, not only the infinite competition, but especially the feeling of staying frozen in the same place terrified me. I felt that this was not right goal for my life. While watching so many excellent pianists following this beautiful path, I found out that all of it was too predictable and asked myself if this was really what I wanted, to be just one in an endless constellation of pianists.

 

Cheguei inclusive a fazer uma pausa de alguns anos para refletir sobre essas questões e fui aos poucos retornando ao piano por caminhos que julguei mais interessantes: a interpretação de músicas mais populares, 

como aquelas do chamado repertório “pianeiro” (basicamente os choros e valsas de Ernesto Nazareth e outros compositores da mesma estética, como Inah Machado Sandoval (1906-2003) e Chiquinha Gonzaga (1847-1935), de Richard Rodgers (1902-1979), a interpretação da música erudita contemporânea (Camargo Guarnieri (1907-1993) e Igor Stravinsky (1882-1971), e, principalmente, a intensa pesquisa e criação de arranjos próprios para a música de Tom Jobim (1927-1994). A obra do Tom me influencia profundamente e está sempre presente em meus concertos.


  • Em 2002, tive a primeira experiência com design sonoro, unindo outros tipos de sons e a música que produzia ao piano. Em colaboração com a artista multimídia Beth Bento, criei arranjos próprios para o álbum Dó Ré Mi Fon Fon 27 Cantigas Brasileiras, no qual integramos à musica, amostras de sons diversos, tais como ruídos e sons do cotidiano, vozes e sons da natureza, entre outros.

    Em seguida, vivi experiências bastante gratificantes e libertadoras, quando me lancei a um trabalho de improvisação livre ao gravar os álbuns Moods Reflections Moods (2004) e Bossa in the Shadows (2007), esse último em duo com o baixista Pedro Baldanza (1953-2019). A ocasião representou o ápice da liberdade de que precisava para finalmente não me sentir como “mais um pianista” no mundo. O prazer de poder realizar uma música autoral e livre me restituiu o sentimento de adequação que eu havia perdido há muito tempo, quando fazia apenas o repertório pianístico tradicional.

 
 

I even took a break for a few years to reflect on these issues and gradually returned to the piano through paths I found more interesting: such as the interpretation of more popular music,

like the so-called "pianeiro" repertoire - mainly the choros and waltzes of Ernesto Nazareth and other composers that had the same aesthetic, such as Inah Machado Sandoval (1906-2003) and Chiquinha Gonzaga (1847-1935), works by Richard Rodgers (1902-1979), the interpretation of contemporary classical music, such as Camargo Guarnieri (1907-1993) and Igor Stravinsky (1882-1971), and, especially, the intense research and creation of my own arrangements for the music of Tom Jobim (1927-1994). Jobim's work influenced me deeply and is always present in my concerts.

  • In 2002, I had my first experience with sound design, joining other types of sounds and the music I produced at the piano. In collaboration with the multimedia artist Beth Bento, I created my own arrangements for the album Dó Ré Mi Fon Fon 27 Cantigas Brasileiras, in which we integrated samples of various sounds to my music, such as noises and sounds of everyday life, voices and sounds of nature etc.

    Then I had some very rewarding and liberating experiences, when I launched myself into free improvisation while recording the albums Moods Reflections Moods (2004) and Bossa in the Shadows (2007), the latter in duo with the bassist Pedro Baldanza (1953-2019). These moments gave me the freedom I was looking for to finally not feel like "just another pianist" in the world. The pleasure of being able to make my own musig with freedom enough healed me from the insatisfaction I felt when I used to play only the traditional piano repertoire.

 
 
 
 

Desde criança, minha outra paixão, além da música, é a natureza. Sempre convivi em harmonia com animais e plantas, nutrindo uma especial fascinação por paisagens naturais. 

Com 10 anos de idade, já cuidava dos jardins de casa, de diversos animais domésticos, fotografava, com a minha jurássica câmera Kodak Instamatic, todas as viagens, registrando todas as paisagens naturais que encontrava pela frente. Hoje, analisando com um certo distanciamento, acredito que a EcoMúsica foi uma decorrência natural dessa paixão pela natureza em sintonia com toda a inquietação artística que descrevi anteriormente. Por fim, não tenho dúvidas em reconhecer a EcoMúsica como algo único e inovador em seu conceito e procedimentos. O Projeto EcoMúsica tem me possibilitado unir essas duas grandes paixões (música e natureza), além de me proporcionar, já em plena maturidade, uma satisfação jamais antes sentida como artista.  Penso então que, embora o percurso tenha sido relativamente tortuoso e instável, seja possível afirmar que tem valido a pena. Todas as experiências musicais, além das sérias e recorrentes angústias relacionadas ao sentimento de inadequação, acabaram por me conduzir finalmente ao caminho estimulante que hoje percorro, com conforto e entusiasmo.

 
 

Since childhood, my other passion, besides music, has been nature. I have always lived in harmony with animals and plants, having a special fascination for natural landscapes.

At the age of 10, I was already taking care of gardens at home, living with pets, and taking pictures, with my Jurassic Kodak Instamatic camera, during all my trips, creating memories of all the natural landscapes I could find. Today, with a certain distance from that time, I believe that EcoMusica was a natural consequence of this passion for nature in tune with all the artistic restlessness I described earlier. Finally, I realized that EcoMusica became something unique and innovative in its concept and procedures. The EcoMusica Project has enabled me to unite these two great passions (music and nature), and has given me, already as a grown man, a satisfaction I had never felt as an artist before.  So I think that, although my path throughout life has been relatively difficult and unstable, it is possible to say that it was all worth it. All the musical experiences, in addition to the serious and recurrent anguishes related to the insatisfaction I used to feel, finally led me to the stimulating path that I walk today, with happiness and enthusiasm.

 

O imaginário de um compositor, assim como acontece com qualquer pessoa, tem origem nos inúmeros estímulos e vivências acumuladas, nos contatos e interações que desenvolveu ao longo da vida,

nas experiências positivas e negativas. Acredito que tudo o que o músico ouve desde a infância e todos os sons que estão à sua volta formam aquilo que poderíamos chamar de seu repertório sonoro interno.

 
 

The imaginary of a composer, just like the imaginary of anyone else, is formed based on many stimuli and experiences throughout life,

contact and interaction with other people, as well as good and bad experiences. I think that everything a musician listens to since childhood, all sounds around this artist and so on will create this musician’s internal repertoire of sounds.

 
 
 
banner fabio.gif

 

Próximo
Próximo

eco musica